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Indução à Gestão de Produto

Ao ler bibliografias de diversos gestores de produto mais reconhecidos percebemos que a maioria estabelece o seu processo de decisão assente em princípios fundamentais. Os princípios fundamentais são aqueles que definem proposições ou assunções basilares, ou seja, aquelas que não podem ser deduzidas a partir de outras proposições ou assunções.

Um destes princípios fundamentais é aquele que define, por exemplo,que "as funcionalidades devem ser únicas, atómicas e reutilizáveis, como blocos de Lego”, significando isto que, num mundo ideal,os programadores deveriam ser capazes de usar diversas combinações destes blocos para construir aplicações. As funcionalidades devem ser interoperáveis (como blocos de Lego).

Este tipo de pensamento assente em princípios fundamentais é, ele próprio, fundamental já que as aplicações e as empresas crescem, além de queo mercado está constantemente a ficar mais complexo à medida que vão surgindo novos atores e dinâmicas, numa espécie de rede de conhecimento que fica mais densa com o passar do tempo. Conhecer os princípios fundamentais que permitiram a tomada de decisões históricas e que sustentam as opções atuais e futuras, permite atingir um estágio de comunicação que agrega a solidez e a simplicidade. Mais do que manter um portefólio de ideias bem organizadas, um gestor de produto tem de ser capaz de comunicá-las bem aos diversos stakeholders, e tal implica solidez e simplicidade.

Com base nisto, o Product Manager (PM) deverá ser capaz de influenciar os stakeholders e encaminhá-los numa determinada direção, conseguindo entendimentos que beneficiem o resultado final, seja este o próprio produto ou o desempenho do produto no mercado. Com stakeholders refiro-me a quaisquer equipas internas da organização e às entidades externas, porque idealmente o gestor de produto age como uma espécie de maestro que articula e agiliza a relação de todos aqueles que estão de algum modo envolvidos no processo de conceção, desenvolvimento, entrega e manutenção dos seus produtos.

Princípios fundamentais

Referida a importância de dominar os princípios fundamentais e de que forma isto será decisivo para gerar uma dinâmica positiva de todos os envolvidos à volta do sucesso do produto, coloco a questão seguinte: E se fossem também estabelecidos princípios fundamentais à volta da própria atividade de gestão de produto?

Vamos tentar um ensaio…

Lógica versus Criatividade

Os primeiros princípios fundamentais da gestão de produto podem ser resumidos a:

1. Maximizar o impacto na missão da organização: a partir das definições estratégicas organizacionais, desenvolver uma estratégia de produto que maximize o impacto do mesmo na missão da organização (que normalmente traduz-se em resultados);

2. Realizar tudo através dos outros: parece estranho, mas a verdade é que os PM não participam diretamente na construção dos produtos. Ao invés, eles devem servir de garante para que todos os intervenientes o façam da melhor forma possível.

Estes dois princípios representam o lado esquerdo e direito do cérebro. O lado esquerdo é o responsável pela lógica, investigação e rigor, enquanto que o lado direito é aquele a que se atribui a criatividade, a intuição e a empatia.

Partindo deste princípio, um gestor de produto necessita de articular bem estas duas facetas e os dois princípios identificados acima devem servir como os princípios fundamentais de todas as suas decisões.

Neste artigo, debruçar-me-ei sobre o primeiro princípio, reservando o segundo para uma próxima edição.

Princípio A - Maximizar o impacto na missão da organização

A orientação principal dos colaboradores de uma organização deverá centrar-se na missão da mesma, seja ela a obtenção de lucros, a solidariedade social ou outra.

Para atingir este objetivo, a maioria dos colaboradores de uma empresa trabalha para fornecer um produto ou serviço aos seus clientes mediante a conceção do produto (engenheiros, arquitetos e designers), a entrega do mesmo ao mercado (marketing e vendas, formadores e consultores) e a execução de tarefas pós-venda (suporte técnico).

A gestão de produto não realiza quaisquer tarefas relacionadas com a criação e operacionalização dos produtos no mercado. Ao invés disto, a sua principal responsabilidade é antecipar os comportamentos do mercado, avaliar a execução das tarefas pelas diferentes equipas alinhar todos os intervenientes de modo a que os objetivos sejam devidamente atingidos, ou seja, garantir o sucesso do produto. Na prática, tudo isto significa seguir escrupulosamente a estratégia de produto e, com isto, garantir o impacto esperado na missão da organização.​​​​​​​

Definir a estratégia de produto é (e deve ser) a maior responsabilidade do gestor de produto. Para a definição desta estratégia, existem três pilares essenciais:​​​​​​​

1. Objetivos

Tudo deve começar pelos objetivos. Se não existe uma definição devidamente clara do que se pretende atingir, então não pode haver uma definição clara do caminho a seguir e, neste caso, o melhor é nem começar, sob pena de não atingir exatamente o que se pretendia, ir mais longe ou desperdiçar recursos.

Neste capítulo, uma das dificuldades mais prementes dos gestores de produto reside no facto de não terem tempo para consolidar os objetivos, muitas vezes devido à pressão do mercado que impõe períodos muito curtos de time-to-market. Mas esta definição é tão importante como a própria conceção do produto e isto tem de ser interiorizado por toda a organização.

2. Envolventes interna e externa

Normalmenteos planos definem-se com a expectativa de atingir os seus objetivos em terreno plano, mas a realidade não é exatamente assim. É impossível prever e antecipar todos os obstáculos e, muitas vezes, a distância face ao objetivo dificulta (ou impossibilita) a perceção das derrapagens ao longo do percurso. Para lidar com isto, é essencial que o gestor de produto esteja permanentemente atento ao contexto e antecipe os seus efeitos.

Um novo produto que surge no mercado, um novo concorrente que entra em jogo, alterações no ambiente político ou socioeconómico, o desabrochar de novas tecnologias, mudanças internas nas equipas ou na capacidade de investimento, alterações estratégicas da organizaçãosão exemplos de efeitos contextuais das envolventes externa e interna nos projetos e que frequentemente implicam a redefinição dos mesmos.

Há dois sinais fundamentais que devem ser auscultados pelos gestores de produto:

  • Sinais dos clientes: o acompanhamento de informação qualitativa e quantitativa dos clientes. O número de clientes, a intensidade de uso e a satisfação com os produtos são os "sinais vitais” da estratégia de produto e do permanente alinhamento do plano com os objetivos;

  • Sinais do mercado: a atenção permanente ao mundo que existe para lá da organização permite perceber as dinâmicas competitivas, políticas e socioeconómicas que afetam a própria empresa e os seus clientes. As variações provenientes do mundo exterior são extremamente críticas e a sua permanente leitura é fundamental para uma gestão de produto bem-sucedida.

Enquanto os objetivos forem válidoso projeto permanece válido e isto muitas vezes implica mudanças no seu conteúdo e nos planos de execução. Apesar destas mudanças serem invariavelmente mal recebidas pelas equipas, o importante é que o gestor de produto mantenha a visão sobre o todo e consiga, através da sua influência, o realinhamento das equipas de modo a que as mesmas entendam que as concessões fazem parte do caminho e que o que realmente importa é o objetivo. Este é um excelente veículo para manter algo que é essencial: a motivação de todos os intervenientes.

3. Recursos disponíveis (capacidade, dinheiro e tempo)

Tal como numa nave espacial, a capacidade da mesma atingir o seu destino depende muito da quantidade de combustível disponível, da qualidade da sua tripulação e da capacidade de aproveitar a gravidade dos vários corpos celestes para, no momento certo, conseguir potenciar os impulsos rumo ao seu destino.

Do mesmo modo, o ciclo de vida dos produtos é definido pelo lançamento de evoluções (em ciclos de projetos) e os projetos são delimitados por: (a) investimento, (b) equipa e (c) tempo adequado para o lançamento. Tudo isto define o (in)sucesso a atingir o objetivo.

Gerir produtos implica o permanente equilíbrio entre diversos fatores, tais como, a estratégia corporativa, os inputs de mercado, os recursos disponíveis e o tempo.

É necessária sensibilidade e empatia para garantir uma dinâmica positiva centrada no êxito competitivo e, consequentemente, em resultados para a organização e para os seusstakeholders.

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